Apesar de mostrarem confiança e otimismo quanto ao futuro da informação radiofónica, quase um terço dos jornalistas respondentes (30,4%) teme pelo seu próprio futuro profissional no meio e metade têm dúvidas quanto à sobrevivência da sua rádio depois da pandemia. São resultados de um inquérito aplicado aos profissionais da informação radiofónica portuguesa e que pretendeu perceber quais as rotinas e constrangimentos que ocorreram no seu trabalho entre março e maio de 2020, período durante o qual o país conheceu o primeiro caso de contaminação de Covid-19 em território nacional, estiveram em vigor três Estados de Emergência e teve início o período de desconfinamento.
Caracterização dos respondentes
O questionário esteve disponível para resposta entre os dias 25 de maio e 19 de junho de 2020. Responderam 56 jornalistas que exercem funções na rádio, representando 9,92% do universo de jornalistas radiofónicos em Portugal. Dos respondentes, 82,1% possuem carteira profissional, 14,3% o título de equiparado a jornalista e 3,6% o título de estagiário. Quanto ao género, responderam mais homens (55,4%) do que mulheres. A idade dos respondentes é muito variável, tendo-se verificado uma distribuição pelas várias faixas etárias entre os 18 e mais de 55 anos. Quanto à formação académica, 66,1% são licenciados, 23,2% possuem o ensino secundário e 7% o mestrado.
De entre os jornalistas que responderam ao questionário, a maior parte, 55,4%, exerce funções em rádios locais, 23,2% nas emissoras de cobertura nacional e 21,4% nas rádios regionais.
Com exceção da Guarda, recebemos respostas de jornalistas a exercer funções em rádios sediadas em todos os restantes distritos de Portugal Continental, Açores e Madeira. Lisboa, com 30,35%, foi o distrito com mais respondentes.
Confiança no sector, mas receio pessoal
Um conjunto de questões pretendia avaliar a perceção dos jornalistas em relação ao futuro do sector e à sua situação profissional. Os dados mostram que há confiança em relação ao futuro da rádio enquanto meio, mas aumentam as dúvidas quanto ao futuro da sua rádio e ao seu próprio futuro profissional.
Metade dos inquiridos revelou sentir receio sobre o futuro da sua rádio e 30,4% temem vir a ser despedidos nos próximos tempos. 89,3% não acreditam que as receitas publicitárias vão aumentar e 71,4% consideraram que o Estado deveria ajudar financeiramente o sector.
Mas, os dados são muito diferentes quando se pronunciam sobre a rádio enquanto meio de comunicação. 78,6% consideraram que a informação na rádio vai continuar a ser importante para os ouvintes e 60,7% dos respondentes acreditam que a rádio vai ultrapassar este período de crise.
Quanto ao trabalho realizado durante a pandemia, 91% dos respondentes consideraram ter sido equilibrado em relação à cobertura da Covid-19, não lhe tendo dedicado tempo excessivo em função da sua importância. No mesmo sentido, 83,9% consideram que o tratamento noticioso foi adequado ao revelarem estórias de pessoas envolvidas nos acontecimentos (médicos, doentes, etc) e 75% rejeitam a ideia de ter sido focado em apenas números (de mortes, infetados ou curados). 82,14% consideram que a qualidade da informação veiculada na rádio manteve-se neste período.
A mesma visão positiva foi revelada sobre a importância da informação radiofónica durante e após a pandemia. 82,1% dos respondentes consideraram que a importância da informação radiofónica para os ouvintes aumentou entre março e maio de 2020 e que isso se deveu principalmente ao facto de a rádio continuar a representar uma fonte de informação credível para os indivíduos (87,3%).
Rotinas alteradas e uma rádio mais multimédia
Apesar de a pandemia ter obrigado a que muitos portugueses tivessem de exercer a sua atividade profissional em teletrabalho, no caso dos jornalistas da rádio, a redação continuou a ser o local privilegiado para o desempenho de funções, já que 51,9% revelou ter trabalhado na rádio sem alterações entre março e maio de 2020.
Por outro lado, 48,1% dos respondentes viram as suas rotinas de trabalho alteradas durante a pandemia. Destes, o teletrabalho foi a solução adotada em 29,6% dos casos e apenas 3,7% estiveram na situação de layoff. Registamos ainda uma série de jornalistas que combinaram diversas situações: a alternância entre semanas na redação e em teletrabalho; rotação entre layoff, teletrabalho e redação ou a redução do horário de trabalho, situações que no total representam 10,7% dos respondentes. Entre março a maio de 2020, apenas um jornalista revelou ter sido despedido.
Num conjunto de questões pretendia-se obter o grau de concordância com várias afirmações referentes a práticas e rotinas no trabalho dos jornalistas. Verificamos que o trabalho de reportagem foi, de longe, a prática mais afetada durante o período em análise já que 66,07% dos respondentes concordaram ou concordaram muito com a afirmação “Passei a fazer menos reportagem”. Em sentido contrário, os dados apurados permitem-nos verificar que a disponibilização de conteúdos multimédia foi a prática que mais aumentou entre os jornalistas respondentes, uma vez que 67,85% referiram ter passado a fazer mais trabalho multimédia, resultados que se explicam também com o grau de concordância revelado pelos jornalistas da rádio em relação ao uso de ferramentas digitais, pois 94,64% concordam ou concordam muito com esse aumento de utilização.
O uso de plataformas digitais foi, assim, muito frequente durante o Estado de Emergência e início do desconfinamento. 85,7% dos jornalistas admitiram que em relação a um período normal de trabalho, a utilização de sites como fontes de informação aumentou, seguindo-se o Facebook com 56,3%. Já para a obtenção de sons para as peças, o Whatsapp foi a plataforma que registou um maior aumento, 66,1%, quando comparado com um período normal de trabalho. Seguiu-se o Skype e o Zoom, ambos com 46,4% das respostas.
Numa outra questão, pedia-se aos jornalistas que respondessem em qual das plataformas de distribuição de conteúdos jornalísticos o seu trabalho sofreu mais alterações entre março e maio de 2020. Através das respostas, percebemos que esse trabalho aumentou em todas, mas sobretudo no site (57,14%) e nas redes sociais (62,5%)
No período em análise, as maiores preocupações dos jornalistas tiveram a ver com a necessidade de fornecer informações úteis aos ouvintes sobre a pandemia, com 94,64% das respostas. A importância da confirmação das informações (89,28%) e o perigo das fake news (87,5%) foram também referidas pelos jornalistas inquiridos como aspetos cuja preocupação aumentou durante a pandemia.
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