Digital News Report 2018: redes sociais menos usadas para aceder a notícias

Junho 14, 2018 • Investigação, Jornalismo, Últimas • by

O uso de redes sociais para aceder a notícias começou a cair em vários mercados-chave – após anos de crescimento contínuo, de acordo com o sétimo Digital News Report, do Reuters Institute for the Study of Journalism, da Universidade de Oxford. O relatório, baseado num inquérito online da YouGov com 74 mil respondentes, em 37 países, incluindo Portugal, diz que a queda é em grande parte atribuível às alterações nos algoritmos do Facebook, mas que os utilizadores também estão preocupados com a sua privacidade, a natureza tóxica dos debates na plataforma e com a distinção entre notícias reais e falsas.

Gustavo Cardoso, Professor do ISCTE-IUL e Director do OberCom comenta os resultados do DNR2018 para Portugal: quase três quartos dos respondentes dizem preocupar-se com o que é falso na Internet. Metade dos portugueses que usam Internet diz confiar em notícias que encontra através de motores de busca, mas só menos de um terço dizem confiar em notícias que vêm nas redes sociais.

O relatório constata que apenas 23% confiam nas notícias às quais acedem nas redes sociais, em comparação com 34% das que acedem através de pesquisas, 44% confiam nas notícias em geral e 51% confiam nas notícias provenientes das fontes que usam.

O relatório traz algumas notícias positivas para as empresas jornalísticas que procuram construir relações diretas com os consumidores e focar-se no jornalismo de qualidade. O número de pessoas que pagam por notícias on-line está em alta em vários países, as notificações por e-mail e por telemóvel estão a ajudar a criar maior lealdade, enquanto novos modelos de negócios, como filiação e doações, começam a ganhar força.

Q6_2018_1/2/3/4. Please indicate your level of agreement with the following statements. I think you can trust ‘most news’/’news I consume’/’news in social media’/’news in search engines’ most of the time. Base: Total sample in all markets = 74194.

 

Mais sobre o declínio do Facebook como fonte de notícias e a mudança para as plataformas de messaging

Embora o uso geral do Facebook continue elevado e estável, o número de pessoas que o utilizam como fonte de notícias está a diminuir na maioria dos mercados. O consumo de notícias via Facebook caiu 9 pontos percentuais nos Estados Unidos, em comparação com 2017, e caiu 20 pontos junto dos grupos mais jovens. Simultaneamente, assistimos a um aumento no consumo de notícias através de plataformas alternativas como o WhatsApp, o Instagram e o Snapchat – particularmente pelos grupos mais jovens. O uso do WhatsApp para notícias triplicou, em média, nos últimos quatro anos para 15%, mas tende a ser muito maior em países como a Malásia (54%) e a Turquia (30%), onde pode ser perigoso expressar opiniões políticas em redes mais abertas.

Q12B. Which, if any, of the following have you used for finding, reading, watching, sharing or discussing news in the last week? Base: Total sample in selected markets: Note: From 2015-18, the 12 markets included are UK, US, Germany, France, Spain, Italy, Ireland, Denmark, Finland, Japan, Australia, Brazil. In 2014, we did not poll in Australia or Ireland.

As alterações no algoritmo do Facebook desempenharam claramente um papel nas mudanças de práticas, pois a empresa deu prioridade às interações com familiares e amigos e está a tentar limitar o impacto das notícias “falsas”. No entanto, as evidências retiradas dos focus groups sugerem que algumas percepções dos consumidores estão a mudar e, consequentemente também os seus comportamentos.

Preocupação com a desinformação espalha-se pelo mundo

Mais de metade dos respondentes (54%) dizem estar preocupados se as notícias são reais ou “falsas”, na internet. Esta preocupação é mais elevada em países como o Brasil (85%), a Espanha (69%) e os Estados Unidos (64%), onde situações políticas polarizadas se combinam com uma elevada utilização das redes sociais. Na Alemanha (37%) e na Holanda (30%), onde as recentes eleições não foram afetadas por preocupações com conteúdo “falso”, a preocupação apresenta níveis bem mais baixos.

A maior parte dos respondentes acha que a correção de problemas com notícias “falsas” e não confiáveis é da responsabilidade dos editores (75%) e das plataformas (71%). Isto ocorre porque grande parte das notícias sobre as quais se queixam dizem respeito a notícias tendenciosas ou imprecisas originárias dos media do mainstream, e não são notícias completamente inventadas ou distribuídas por potências estrangeiras ou sites que procuram ganhar dinheiro com notícias inventadas. Mas o apetite pela intervenção do governo no que concerne a desinformação é muito diferente. O apoio na Europa (60%) e na Ásia (63%) contrasta com as reticências nos EUA, onde apenas quatro em cada dez (41%) pensam que o governo deveria intervir mais.

O Professor Rasmus Kleis Nielsen, um dos editores do relatório e Director de Investigação do Reuters Institute for the Study of Journalism, afirma: “Muitos responsabilizam claramente as principais plataformas por problemas de desinformação, mas responsabilizam ainda mais os publishers por notícias não confiáveis. Toda a discussão em torno da desinformação é sobre os media digitais, mas o uso frequente do perigoso e enganoso termo “fake news” (notícias falsas) está ligado a uma crise de confiança de longa data, onde grande parte do público não acha que pode confiar nas notícias, especialmente em países com alta polarização a nível político e onde muitos meios de comunicação são vulneráveis a influências económicas ou políticas indevidas.”

Modelos de negócios continuam a evoluir

O relatório deste ano contém novidades positivas e negativas para os editores que desejam gerar receita on-line sustentável. Os países nórdicos registaram aumentos significativos nos números dos que pagam por notícias online, com a Noruega a atingir 30% (+ 4), a Suécia 26% (+6) e a Finlândia 18% (+4). Todos estes países têm um pequeno número de título de imprensa, a maior parte dos quais procura de forma incansável uma variedade de estratégias de paywall. Por outro lado, os mercados mais complexos e fragmentados da Europa tiveram pouco crescimento nas assinaturas, apesar do aumento das tentativas de cobrança de algum conteúdo on-line.

O aumento significativo nas assinaturas digitais nos Estados Unidos (o chamado Trump Bump), do ano passado, foi mantido, enquanto doações e filiações baseadas em doações estão a surgir como uma estratégia alternativa, cada vez mais significativa, em Espanha, no Reino Unido e nos Estados Unidos. Este tipo de pagamento está intimamente ligado ao posicionamento político à esquerda e centra-se, de forma desproporcional, nos jovens. O Guardian atraiu centenas de milhares de doações e o relatório sugere que cerca de um quarto dos respondentes pode estar preparado para pagar, no futuro, caso os órgãos de comunicação social não possam cobrir os custos de outras formas.

O relatório também revela que mais de dois terços dos respondentes (68%) não estão cientes dos problemas financeiros da indústria dos media ou acreditam que a maioria das empresas de media lucra com as notícias digitais. Aqueles que estavam cientes de que a maioria dos jornais digitais dão prejuízo têm maior probabilidade de pagar por uma assinatura de notícias ou fazer uma doação.

Outros destaques do relatório desde ano:

• Pela primeira vez, o relatório mede e analisa o impacto da literacia em relação às notícias. E mostra que as pessoas com maior nível de alfabetização tendem a preferir marcas de jornais às de TV, e usam as redes sociais para aceder às notícias de forma diferente da população em geral. Estas pessoas também são mais cautelosas em relação à intervenção dos governos para lidar com a desinformação.

• Em muitos dos países analisados, o relatório encontra um declínio acentuado nas audiências de notícias televisivas, especialmente nos telejornais às horas marcadas. Estas tendências estão a afetar muitas emissoras públicas, que estão a lutar para atrair audiências online e para conseguir envolvimento dos mais jovens

• Os podcasts estão a tornar-se cada vez mais populares, a nível mundial, devido à melhoria dos seus conteúdos e a uma distribuição mais fácil. São usados quase o dobro nos EUA (33%) em comparação com o Reino Unido (18%). Entre os mais jovens, a utilização de podcasts é hoje mais frequente que a audição de rádio.

• Assistentes digitais ativados por voz, como o Amazon Echo e o Google Home, continuam a crescer rapidamente, abrindo novas oportunidades para as notícias áudio. A sua utilização mais do que duplicou nos Estados Unidos, na Alemanha e no Reino Unido, com cerca de metade dos que utilizam esses dispositivos a usá-los em específico para obter notícias e informação.

• Os consumidores continuam relutantes quanto ao consumo de notícias em vídeo nos sites dos órgãos de comunicação social. Mais de metade do consumo tem lugar noutros locais como o Facebook ou o YouTube. Os americanos e europeus gostam de ver menos vídeos online que os asiáticos.

• 18% acedem regularmente a emails com notícias, com 16% a utilizar as notificações no telemóvel semanalmente. Nalguns países os utilizadores começam a queixar-se que são bombardeados com demasiadas mensagens, enquanto 37% dos que não recebem notificações afirmam que nada os encoraja a subscrevê-las.

METODOLOGIA
Todos os números, exceto quando referenciado, são da YouGov Plc. A pesquisa foi levada a cabo em 37 países; Estados Unidos da América, Reino Unido, Alemanha, França, Itália, Espanha, Portugal, Irlanda, Noruega, Suécia, Finlândia, Dinamarca, Bélgica, Holanda, Suíça, Áustria, Hungria, Eslováquia, República Checa, Polónia, Croácia, Roménia, Bulgaria, Grécia, Turquia*, Coreia do Sul, Japão, Hong Kong, Malásia, Taiwan, Singapura, Austrália, Canada, Brasil*, Argentina, Chile e México*.

O Digital News Report é publicado pelo Reuters Institute for the Study of Journalism. Pode aceder ao relatório aqui

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