Em Portugal continua a confiar-se em notícias, mas interesse diminui significativamente

Junho 21, 2022 • Investigação, Jornalismo, Jornalismo digital, Top stories • by

A excessiva tematização da agenda noticiosa em torno dos temas pandemia e eleições legislativas 2022 pode estar relacionada com a saturação e quebra geral no interesse por notícias, secundadas pelo aumento no número de pessoas que evitam notícias voluntariamente. Ao mesmo tempo os níveis de confiança nas notícias continuam a contribuir para que Portugal se distinga no panorama comparativo internacional, com 61% dos inquiridos a afirmar que confiam em notícias em geral.

Cada vez mais portugueses escolhem evitar notícias

Entre 2021 e 2022, o interesse por notícias caiu, em Portugal, 17,5 pontos – 51,1% dos inquiridos do Reuters DNR 2022 – e a proporção de inquiridos que dizem não ter interesse em notícias mais do que duplicou, aumentando em 5,5 pontos percentuais face ao ano anterior.

Entre os portugueses que utilizam a Internet, observa-se que o interesse por notícias em geral aumenta com a idade, rendimento do agregado familiar e escolaridade dos inquiridos. Já a diminuição no interesse por conteúdos noticiosos é transversal, registando-se, no entanto, quebras mais acentuadas entre os portugueses com menores rendimentos e escolaridade mais baixos.

O evitar ativo de notícias, ou seja, o não consumo voluntário de conteúdos noticiosos aumentou de forma significativa entre 2017 e 2022: em 2017, quase metade dos portugueses utilizadores de Internet diziam nunca evitar notícias de forma ativa e voluntária (47%) e em 2022, passados 5 anos, essa proporção caiu para menos de metade, na ordem dos 25,3 pontos percentuais, cifrando-se nos 21,7%. Entre as principais razões para o evitamento voluntário de notícias surge o excesso de notícias sobre a Covid-19 (36,1%), o cansaço com o excesso de notícias em geral (25,8%), e o facto de as notícias poderem ter um impacto negativo no humor (20,2%).

Portugal continua no top 3 dos países que mais confiam em notícias

Em 2022, Portugal continua a distinguir-se no panorama comparativo internacional, com 61% dos inquiridos no nosso país a afirmar confiar em notícias em geral. Portugal posiciona-se, assim, no 2º lugar entre 46 países, atrás apenas da Finlândia, e 19 pontos percentuais acima da média global de 42%. Em termos históricos, é de registar a estabilidade deste indicador no nosso país, sobretudo entre 2017 e 2022, período em que a proporção de inquiridos em Portugal a afirmar confiar em notícias não variou mais de 5,6 pontos percentuais, entre os 56,5% em 2020 e os 62,1% em 2018.

Os dados mostram que os portugueses mais foram afetados pela Covid-19, em termos pessoais, revelam maiores índices de confiança em conteúdos noticiosos. Estes tendem, também, a estar mais preocupados com a legitimidade de conteúdos online e com o que é real e falso na internet.

Em termos gerais, mais de 7 em cada 10 portugueses dizem-se preocupados com este tipo de conteúdos e com os seus efeitos. Os temas sobre os quais os portugueses mais encontram informação falsa ou parcialmente incorreta são a Covid-19 (42,2%), assuntos relacionados com política (34,4%) e produtos e serviços (22,1%).

As marcas continuam a ser mais importantes que jornalistas, a nível individual

Entre os portugueses que utilizam a Internet, 57,2% dizem procurar notícias por marcas específicas mass-mediáticas. Por sua vez, apenas 42,8% dos inquiridos associam a pesquisa de notícias a jornalistas ou comentadores concretos.

Mas este quadro sofre algumas alterações se pusermos a idade na equação. Os portugueses abaixo dos 35 anos de idade tendem a escolher mais as notícias através da associação a marcas específicas – 66,7%, sendo que nas gerações mais velhas, acima dos 35 anos de idade, existe um maior equilíbrio na pesquisa por marcas ou jornalistas / comentadores (54,9% vs. 45,1%).

Comparando Portugal com os outros países participantes no relatório, vemos que surge como um dos países cujos inquiridos mais associam a pesquisa de notícias à dimensão personalizada na figura de jornalistas / comentadores. Neste quadro, Portugal apenas é ultrapassado na Europa por França e Turquia. Países como Finlândia, Dinamarca, Suécia e Noruega destacam-se como os mercados, a nível global, onde o peso de marcas específicas é mais preponderante em detrimento da importância de jornalistas ou comentadores.

Televisão ainda é rainha no acesso a notícias, em Portugal

Portugal continua a ser um dos países onde a televisão mantém o papel principal nas dietas informativas da população, sendo usada para acesso a notícias por 74% dos portugueses e por 53,6% como principal fonte de notícias.

A importância da televisão no nosso país deve-se, em grande medida, às preferências dos portugueses mais velhos, já que entre os mais jovens a televisão, enquanto principal fonte de acesso a notícias, assume um peso similar ao das redes sociais. Em termos de dispositivos, o smartphone continua a ser a tecnologia mais utilizada, por 85,1% dos respondentes, assegurando o consumo de notícias para 74,8% dos portugueses utilizadores de Internet.

Quando inquiridos sobre os formatos noticiosos online que preferem, 7 em cada 10 portugueses apontam as notícias sobretudo em texto (72,2%), enquanto as notícias em vídeo apresentam valores ainda residuais, na casa dos 10,8%. No entanto, o vídeo possui uma maior implantação entre a população mais jovem – 16,8% consome notícias sobretudo em formato vídeo, enquanto apenas 9,1% dos portugueses acima dos 35 anos de idade o faz.

Pagamento por notícias mantém-se abaixo da média

Em Portugal, o pagamento por notícias continua a tardar em ganhar dimensão no mercado nacional. Em 2022, apenas 12% dos portugueses afirmam ter pago por notícias em formato digital no ano anterior – menos 5 pontos percentuais face à média global de 17%.

A forma de pagamento mais frequente é a subscrição de um serviço noticioso de forma contínua, ongoing (32,4%), seguido do pagamento por notícias de forma indireta, através da subscrição de outro serviço (27%) e o acesso a notícias digitais através de um pacote que inclui notícias em papel (22,1%, Ex. o jornal Expresso através de código no jornal impresso).

Observando os outros tipos de conteúdos que compõem a economia digital contemporânea, verifica-se que os conteúdos pelos quais os portugueses mais pagam são o streaming de filmes / séries. – 57% dos portugueses que utilizam a internet subscrevem um serviço de streaming audiovisual de forma continua, 43,6% um serviço de streaming de música, 29,8% algum pacote de canais desportivos e 21,4% um serviço de audiobooks ou podcasts. Num quadro comparativo em que apenas 12,1% dos portugueses pagou por notícias digitais no ano anterior, observa-se que a economia digital é, em Portugal, fortemente dominada pelo entretenimento em detrimento dos conteúdos e da esfera informativa.

Géneros noticiosos

Em 2022, o Reuters DNR volta a recolher informação sobre os géneros noticiosos que mais interessam aos portugueses que utilizam a Internet.

O género internacional lidera o ranking de interesse, sendo indicado por mais de metade dos inquiridos (55,6%), seguindo-se as notícias sobre o “coronavírus / pandemia”, indicados por 55,2%, e as notícias locais, por 53,9%.
Os temas relacionados com “ambiente e alterações climáticas” surgem num destacado quarto lugar, sendo apontados por 52,7% dos respondentes como um dos géneros que mais motiva interesse.

Conteúdos relacionados com “educação e política” motivam o interesse de cerca de 4 em cada 10 inquiridos (41,9% e 41,4%, respetivamente) e géneros como “entretenimento ou celebridades” (22,0%) ou divertimento (32,3%) surgem como os tópicos menos relevantes para os portugueses em termos de interesse.

Entre os portugueses mais jovens, as notícias sobre a pandemia são o género que mais interessa a 46,6% destes inquiridos, seguidos dos temas sobre ciência e tecnologia (42,8%), seguindo-se a cultura (41,7%), “saúde mental e wellness” (40,6%) e também “notícias locais” (40,4%), “crime e segurança” (39,5%) e desporto (38,6%).

Redes sociais

2022 não foge à regra e o mercado das redes sociais continua fortemente concentrado e controlado pelas plataformas Meta (Facebook, WhatsApp, Instagram e Facebook Messenger) e Google (Youtube).

O Facebook é utilizado, em geral, por ¾ dos portugueses que utilizam a Internet (75,9%) e para o consumo de notícias por cerca de metade (48,7%). Segue-se a plataforma de vídeo Youtube (67,7% uso geral e 24,5% para consumo de notícias) e o WhatsApp (67% e 24,4%, respetivamente).
De forma agregada, 91,2% dos portugueses usam alguma plataforma Meta em geral, e 66,2% fá-lo para se informar.

Os portugueses usam maioritariamente (79,4%) apps de mensagens para fins diversos, e cerca de um terço (33,5%) usam estas plataformas para se informar através de notícias.

O Instagram foi a rede que mais aumentou em termos de utilização – 4,7 pontos percentuais dos 48,3% em 2021 para 53,0% em 2022, no uso geral, e 5,6 pontos percentuais dos 14,4% para os 20,0% no consumo de notícias.

A observação da utilização de redes sociais para consumo de notícias desde 2015, é reveladora da configuração do mercado em termos e do peso relativo dos diferentes atores. Desde 2015 que o Facebook, que longo dos últimos anos tem enfrentado diversos desafios ao nível da sua relação com a desinformação, perdeu quase 20 pontos percentuais (18,4 pp.) no consumo de notícias.

Por sua vez, as redes WhatsApp e Instagram, também propriedade do grupo Meta, aumentaram de forma significativa a sua presença enquanto veículos de distribuição de notícias.

Em termos de perceção sobre a adequação da quantidade de conteúdos informativos nas diferentes redes, os utilizadores de Facebook e TikTok destacam-se por razões opostas: sensivelmente ¼ dos utilizadores do Facebook considera que há demasiados conteúdos noticiosos nos seus feeds, com origem em marcas de notícias. Por oposição, quase 1/5 dos utilizadores do TikTok (18,2%), consideram insuficiente a quantidade de conteúdos de género noticiosos nessa rede, configurando uma potencial oportunidade para as marcas mass-mediáticas nesta rede

Sobre o Digital News Report 2022

O Reuters Digital News Report 2022 (ReutersDNR 2021) é o décimo primeiro relatório anual do Reuters Institute for the Study of Journalism (RISJ) e o oitavo relatório a contar com informação sobre Portugal. Enquanto parceiro estratégico, o OberCom – Observatório da Comunicação colaborou com o RISJ na conceção do questionário para Portugal, bem como na análise e interpretação final dos dados.

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