A opinião política já tem o seu espaço no Twitter

Março 2, 2015 • Média e política • by

A utilização da rede social Twitter pelos atores ligados ao campo político e ao campo jornalístico encontra-se em crescimento, sendo que o seu impacto extravasa a presença na rede, ecoando frequentemente nos media tradicionais. De modo breve, são aqui apresentados alguns exemplos que o ilustram e algumas notas, advindas de um trabalho exploratório em curso, que apenas indiciam como o Twitter está a entrar também nas “agendas de investigação” dos estudos de comunicação política.

A especificidade que melhor carateriza esta rede é o limite do número de carateres: 140 por tweet. Aparentemente, tal não é propício à exposição de informação extensa ou complexa e à discussão política, no sentido argumentativo. Porém, existem indícios que é isso que está a acontecer. Para que tal se entenda, será preciso começar por considerar que Web 2.0 não só trouxe novas ferramentas que potenciam a interatividade e a partilha, como também trouxe novas formas de utilizar a palavra e atribuir sentido.

O Twitter é referido como uma plataforma de notícias, sendo que a informação sobre notícias de última hora é uma das suas funções essenciais; os utilizadores são um grupo especialmente em sintonia com notícias, media, cultura e vida cívica; donde, quem fala nesta rede é gente que dá especial atenção a questões políticas; contudo, as suas conversas não são representativas dos pontos de vista da Twittosfera, pois muitas vezes são contra-corrente, segundo o paper “Can Twitter survive in a Facebook world? The key is being different”, do Pew Research Center (2014).

Um exemplo da utilização do Twitter, tornado recentemente sobejamente conhecido, é o caso do ministro das Finanças grego Yanis Varoufakis (atualmente tem mais de 310 mil “seguidores” e alguns dos seus tweets têm vários milhares de retweets e de likes). Em tom muitas vezes humorístico, para além de veicularem a mensagem de forma original, os seus tweets têm sido referidos e “ampliados” noutros media, um pouco por todo o mundo. Outro exemplo, de uma utilização bem-sucedida, é a do jovem ministro da Saúde sueco Gabriel Wikström, de 29 anos, que usa o Twitter para atrair a sua geração para a política. Um último caso, este paradigmático da polémica que pode ocorrer em torno da presença online, foi o de Bruno Maçães, na sua conta identificado enquanto Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, dado o tom virulento e sarcástico dos seus twetts sobre novo governo grego. Para além das inúmeras e acesas reações suscitadas no Twitter, houve repercussões na imprensa internacional.

No âmbito de um trabalho em curso sobre a Twittosfera portuguesa e resultante da análise exploratória já efetuada, é possível afirmar que existe uma forte presença de atores ligados ao campo dos media, particularmente jornalistas, os quais assinam opinião politica nos media tradicionais e/ou ocupam cargos de direção em algum media (a sua credibilidade/notoriedade foi pois aí firmada). É frequente observar-se a referência e a divulgação da opinião publicada noutros media, através da partilha de links para as colunas de opinião dos jornais, para os vídeos das intervenções televisivas, para as publicações no Facebook (dos próprios ou de outros com quem se interage).

Também a utilização da rede pelos de atores com ligação campo político não é negligenciável, já que se verifica uma crescente presença de políticos (na sua maioria jovens), nomeadamente governantes, detentores de cargos partidários, deputados. Têm, naturalmente, uma visibilidade acrescida na Twittosfera que advém do cargo que desempenham, pelo que as ideias que defendem na rede, não raramente, ecoam nos media tradicionais.

Mas estes atores que expressam a opinião no Twitter são os mesmos que já a assinam nos media tradicionais? Em trabalho anterior, no âmbito da realização da tese de doutoramento terminada em 2007, constatou-se uma forte transitoriedade e omnipresença dos mesmos atores (predominantemente políticos ou jornalistas que ocupam o topo da hierarquia, maioritariamente do sexo masculino), resultante de uma simbiose de energias (à qual não são alheias as estratégias dos media) entre a imprensa, a televisão, a rádio e a blogosfera. Em que medida as redes sociais, numa década, alteraram este panorama? Terá o ceticismo de José Gil, manifestado em 2004, em “O Medo de Existir”, perdido acuidade? O espaço público “falta cruelmente em Portugal”, denunciava . Ou são apenas mais um veículo para à exposição de ideias que (já) ocorre nos media representantes e reprodutores do discurso dominante?

Por fim, e relativamente à “opinião política publicada” no Twitter e a quem a protagoniza, registamos aqui apenas duas notas. Esta rede social, por um lado, constitui-se como mais um veículo para a publicitação da opinião (já) publicada nos media tradicionais. Neste sentido, consolida-se a ideia da “transitoriedade” e “omnipresença” e podemos mesmo estar perante o que diríamos ser um reforço da “identidade” deste “subcampo” dos media. Porém, e paralelamente, a discussão e troca de ideias possibilitadas pelas interações que a presença na rede, por definição, facilita e promove introduz alguns aspetos significativamente novos que potenciam o pluralismo e diversidade nos media e, consequentemente, a democraticidade do espaço público, indo ao encontro da ideia que a internet tem “efeitos transformativos na esfera pública que potencialmente – ou já mesmo – têm um grande significado político e democrático, como referiu Baker, em 2007, no seu livro “Media concentration and Democracy – why ownership matters”.

A facilidade de “seguir” alguém (com notoriedade) no Twitter, perguntar e obter resposta, manter ou aprofundar laços do mundo offline, estando numa “rede dentro da rede” (a timeline), faz emergir novos nomes (ausentes dos media tradicionais) e novas ideias, alargando e acicatando a discussão em torno dos assuntos políticos. A forma de obter legitimidade para fazer uso público da opinião pode ser nova, mas o conceito e os pressupostos que a fundam são os mesmos. O valor simbólico desigual da fala, esse, mantém-se. Ou reforça-se?

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