As universidades e instituições de ensino em toda a Europa apostam cada vez mais na formação em jornalismo de dados , apesar de os níveis de oferta variarem, de acordo com um estudo que compara a forma como estas matérias são ensinadas em seis países europeus. O estudo mostra que na Holanda, Alemanha e Reino Unido, a formação em jornalismo de dados floresce nas universidades. Seguem-se a Itália e a Polónia, apesar de em Itália este fenómeno ser tido como menos estruturado. A Suíça tem sido mais lenta a abraçar a disciplina.
O estudo – Estratégias educativas em jornalismo de dados: um estudo comparativo de seis países europeus -, lida com a vertente negligenciada do jornalismo de dados: como são ensinadas as práticas, linguagens e ferramentas pelas universidades e escolas de jornalismo na Europa?
O artigo resulta de uma colaboração entre investigadores europeus em seis países: Philip Di Salvo (Università della Svizzera italiana, Suíça), Tobias Eberwein (Institute for Comparative Media and Communication Studies, Áustria), Harmen Groenhart (Fontys University of Applied Sciences, Holanda), Michal Kus (University of Wroclaw, Polónia), Colin Porlezza (University of Zurich, Suíça), e eu. Os resultados da investigação serão publicados numa edição próxima da Journalism.
O jornalismo de dados é recente e está em evolução
O ponto de partida da investigação passa por perceber que é crucial saber a forma como o jornalismo de dados é ensinado, para perceber os desafios éticos presentes. A educação em jornalismo de dados é uma nova e multidisciplinar parte da formação em jornalismo e inclui imensas possibilidades. Por exemplo, computação/informática e visualização são diferentes na era digital e a forma como são ensinadas deverá ter em conta o papel cada vez mais relevante desempenhado pelos dados numéricos.
O jornalismo de dados contemporâneo, a partir da natureza diversificada de dados e do seu tamanho, está também intimamente relacionado com questões jornalísticas fundamentais, tais como a ética, transparência, e a validação (?).
A nossa investigação compara programas de formação em jornalismo de dados em seis países (Alemanha, Suíça, Holanda, Itália, Polónia, e o Reino Unido). A pesquisa foi conduzida a partir de uma análise de diferentes programas promovidos em cada país, e também a partir de análises de entrevistas com os instrutores. As trajectórias da investigação podem ser sumarizadas em duas partes: as diferenças entre os programas promovidos em todos os países, e, secundariamente, os padrões comuns visíveis.
Entre todos os países analisados, os programas são oferecidos mediante quatro tipos de organização: académica, vocacional, profissional, e cívica. Constatámos que a influência exercida por cada categoria institucional depende principalmente das peculiaridades dos sistemas de media nacionais e da cultura jornalística. Por outras palavras, nos países onde o ensino do jornalismo é geralmente mais institucionalizado, a formação em jornalismo de dados e o background dos professores, também o será. Um exemplo claro é o caso do Reino Unido, onde os educadores e professores de jornalismo geralmente têm um background académico e os cursos são facultados em escolas de jornalismo.
Na Polónia e em Itália, a formação em jornalismo de dados não está sempre disponível
Em países onde os programas de ensino em jornalismo são menos comuns ou menos competitivos, o jornalismo de dados e outras práticas jornalísticas inovadoras raramente são ensinadas, e o background dos educadores e professores é mais heterogéneo. Por exemplo, na Polónia e em Itália, os cursos em jornalismo de dados seguem frequentemente trajetórias imprevisíveis e padrões de não-institucionalização. São geralmente cursos oferecidos por uma instituição pública, organização sem fins lucrativos ou por jornalistas que aprenderam as técnicas por sua conta ou que as “importaram”.
No geral, a Holanda, Alemanha, e Reino Unido são países onde o ensino do jornalismo de dados floresce ao nível universitário. Itália e Polónia vêm a seguir, mas os jornalistas polacos beneficiam de cursos não-académicos de maior alcance. Em Itália, a oferta parece ser mais reduzida e menos estruturada, enquanto que na Suíça existe um número razoável de opções.
Os cursos universitários oferecem uma abordagem mais arredondada (?): os programas de formação são baseados em competências
Num segundo nível da análise, focámo-nos na estrutura dos cursos. Há duas áreas-chave de análise: o conteúdo dos currículos em jornalismo de dados: (1) prático versus conteúdos teóricos e (2) competências estatísticas versus competências jornalísticas. A nossa pesquisa realça que os cursos ministrados em universidades geralmente seguem uma abordagem mais holística, enquanto os programas de formação oferecidos por empresas de media e outras instituições privadas focam geralmente em competências mais práticas, como a recolha de dados, elaboração, análise, e apresentação.
Quando se trata de ponderar competências estatísticas/matemáticas e jornalísticas, a situação é comparável: em cursos mais longos, particularmente ao nível do ensino superior, o foco é principalmente sobre temas estatísticos. Cursos mais curtos ou workshops tentam combinar competências estatísticas e editoriais.
Quando os programas têm uma base forte dentro da formação em jornalismo, o jornalismo de dados geralmente é enquadrado como apenas uma maneira diferente de lidar com os assuntos jornalísticos mais tradicionais ou como uma ferramenta para destacar questões jornalísticas fundamentais. No contexto desses cursos, as questões tradicionais, como a precisão, a transparência e a validade (prestação de contas?) ainda são colocadas no core do fenómeno do jornalismo de dados e os dados são geralmente considerados como factos, como quaisquer outros.
Instituições não-académicas desempenham geralmente um papel de destaque na formação em jornalismo de dados
A pesquisa também descobriu semelhanças na forma como o jornalismo de dados é ensinado na Europa. Por exemplo, as instituições não-académicas (como o Centro Europeu de Jornalismo ou o Centro para o Jornalismo de Investigação) e as principais agências de notícias internacionais (The Guardian, The New York Times e ProPublica) parecem ter um papel de liderança em todos os países analisados e são geralmente vistos como pilares e tendo as melhores práticas de jornalismo de dados. Além disso, uma grande quantidade de material didáctico está disponível on-line em todos os países analisados; isso poderá dever-se ao facto de os professores estarem disponíveis para partilhar online o seu trabalho.
Os custos do jornalismo de dados serão cruciais para o seu futuro desenvolvimento.
O futuro do jornalismo de dados – e a forma como será leccionado – será fortemente influenciado pelo contexto. O jornalismo de dados é geralmente uma forma mais dispendiosa de reportar em termos de tempo e recursos, e por isso a questão financeira é crucial. A quantidade de dados disponíveis em cada país – um factor que é principalmente associado à existência e implementação do Freedom of Information Act – também terá um papel relevante na implementação efectiva do jornalismo de dados.
O nosso estudo parece provar que as instituições educativas estão lentamente, mas cada vez mais, a implementar o jornalismo de dados.
Artigo original em Italiano. Tradução portuguesa a partir da tradução inglesa.
Créditos imagem: Jonathan Gray / The Data Journalism Handbook / Flickr CC